Alternava de forma aleatória os pés, como me fora ensinado em criança; respirava com dificuldade cada cheiro (mais pesados que os outros) sobre a brisa que dava chapadas frias nas caras pecadoras, fitava com desdenho cada imagem, sem as estar a ver na realidade, desfocava-as e dava-lhes movimento, o meu movimento. Era mais solene do que aquele que qualquer outro ser humano podia visualizar e, por isso, a qualquer outro não chamava a atenção.
Tropecei numa rocha mal colocada, corri um bocado com a ansiedade de acelerar o processo, rodei o meu corpo e foquei um banco castanho e triste, sozinho e anestesiado com o cheiro a urina que o ar trazia para perto dele. Sentei-me numa parte que considerei limpa, após vários segundos de análise, sosseguei-me e parti. De repente, fiquei petrificada, apenas o corpo não se mexia, porque o resto estava completamente ligado, deslocadamente do mundo.
Sorri ironicamente, pois estava a ter um prazer que mais ninguém conseguia ver. Via imensas pessoas que conhecia correrem a alta velocidade, na minha direcção, a rasgarem-me a carne (que não me doía) e a entrarem-me dentro. Senti a força de cada uma delas e, mesmo assim, sentia-me fraca. Nada resolvia esta minha loucura consciente, nada parecia conseguir libertar-me dos momentos que pareciam eternos, vividos a dois, comigo.
A mesma não vontade de aqui estar persegue-me desde o belo dia em que nasci. Tecnicamente, esse dia ainda não chegou, pois faltam precisamente dois meses e oito dias, para que me obrigassem a vir. Com ventosas coladas ao meu cérebro; puxar-me-iam, até que conseguissem arrancar-me do ventre da minha mãe. Talvez, tenham tirado a pessoa errada, ou, então, algo de mim ficou lá e não veio.
Acendi uma vela e apaguei as luzes, sentei-me perto dela, não muito para que o ar que expiro não a matasse, contei-lhe um segredo a uma certa distância, fechei os olhos e, mesmo assim, o calor continuava igualmente excitante. O fogo não discriminava os meus assuntos mais profundos, nem me envergonhava perante uma existência vergonhosa e hostil.
Nunca soube escrever sobre isto, sobre o que vou dizer a seguir: Tenho saudades de o ter comigo. Vou aprendendo a viver desta maneira, com alguma aversão a respirar e a realizar cada ponto da minha desmazelada rotina, vou acendendo de vez em quando uma vela para me lembrar de alguém sem problemas em estar comigo, a três. Vejo-a apagar, vejo o seu fumo a ir embora e lembro-me de gozarmos com os sinais de fumo, quando queríamos comunicar. Vou pondo no meu presente, o passado e, não gozando o futuro, vou fazendo da história um tempo morto…